Santuário de Nossa Senhora da Nazaré (Luanda)
Nesta página:
I . História
II . Descrição
III . Os Painéis de Azulejos da Capela-mor
IV . Nossa Senhora da Nazaré: culto e iconografia
I . HISTÓRIA
A igreja de Nossa Senhora da Nazaré foi edificada em 1664 junto à baía da cidade de Luanda, por André Vidal de Negreiros (1606-1680), em agradecimento por ter sido salvo de um naufrágio, na viagem do Brasil para Angola. Atribuíu o milagre à Senhora da Nazaré, de grande devoção em Pernambuco. Fez erigir também a Irmandade de Nossa Senhora da Nazaré, da qual foi primeiro Juiz.
No ano seguinte, em 1665, realizou-se neste local, em cerimónia solene, o funeral do rei D. António I do Congo († 1665), morto na célebre batalha de Ambuíla, facto de grande relevância histórica. A coroa do Rei – coroa histórica oferecida pelo Papa Inocêncio X ao seu antecessor D. Garcia II - foi depositada junto à imagem de Nossa Senhora, a quem fora atribuída esta vitória. Este acontecimento foi inicialmente representado em pinturas nas paredes laterais, substituídas posteriormente, no século XVIII, por painéis de azulejos.
Em 1869, realizou uma grande campanha de obras. Nesse ano também, a igreja foi entregue aos Padres Espiritanos – a sua primeira missão em Luanda – na pessoa do jovem e activo missionário Pe. José Fulgêncio Lapeyre († 1870).
Em 1886, a pedido dos paroquianos, foi novamente erecta a Irmandade de Nossa Senhora da Nazaré – entretanto desaparecida - pelo Bispo D. António Tomás da Silveira Leitão e Castro (1884-1891). As festas do ressurgimento da irmandade, realizaram-se com grande solenidade em 1 e 2 de Fevereiro de 1887.
Em Março de 1909, fortes chuvadas provocaram a queda do telhado e outros danos, o que motivou a suspensão do culto.
Após a classificação da antiga ermida de Nossa Senhora da Nazaré como Monumento Nacional, em 1922 - primeiro monumento a ser classificado em Angola -, foram particularmente impulsionadas as obras de restauro, terminadas em 1935. Incluíram também a construção do muro de pedra e das grades de ferro do adro. Em 19 de Março de 1939, realizou-se reabertura solene do Santuário presidida por D. Moisés Alves de Pinho (1883-1980), bispo de Angola e Congo.
Nos anos seguintes, foi substituído o painel azulejar no arco triunfal da igreja, representando Nossa Senhora da Nazaré, por cópia simplificada dos painéis anteriores.
Em 1957, a igreja foi elevada a sede de vicariato paroquial, e, em 1961, erecta como igreja paroquial pelo arcebispo D. Moisés Alves de Pinho.
Na década de 70, o templo apresentava numerosos problemas, que motivaram nova intervenção. Foi nesta época, possivelmente, que foi feita a reconstituição, também simplificada, dos célebres painéis de azulejo da capela-mor, entretanto muito deteriorados.
Atingida frequentemente pelas intempéries naturais, a igreja foi sempre restaurada.
Com memórias de milagres sem conta, o Santuário de Nossa Senhora da Nazaré mantém as tradições de devoção mariana e continua a atrair inumeráveis peregrinos que recorrem à Mãe de Deus nas suas aflições.
II . DESCRIÇÃO
O Santuário de Nossa Senhora da Nazaré está localizado em zona central privilegiada, junto à Baía de Luanda. O templo mantém essencialmente a estrutura de igreja de peregrinação, com alpendres laterais, varandas e janelas no piso inferior ladeando o portal. No adro, encontra-se o antigo Cruzeiro.
A fachada principal, de grande simplicidade, tem, sobre o portal, uma lápide com brasão e inscrição:
SENDO GOVERNADOR DESTE REINO ANDRÉ VIDAL DE NEGREIROS EDIFICOU ESTA IGREJA A NOSSA SENHORA DE NAZAREH E NELA FICOU POR JUIZ PERPETUO ANNO 1664.
A fachada encontra-se ladeada por corpos alpendrados, com pequenos arcobotantes, e arcarias de volta perfeita. Do lado direito a torre tem um singular campanário de duas sineiras, com remate em volutas recortadas.
O interior, muito simples, é de uma só nave e capela-mor. À entrada, do lado esquerdo encontra-se a primitiva pia baptismal e, junto às portas laterais, duas originais pias de água benta.
As paredes encontram-se revestidas até meia altura, por silhares de azulejos azuis e brancos, de albarradas, conservando-se ainda alguns originais.
Do lado esquerdo, encontra-se uma antiga imagem de Santa Efigénia da Etiópia, proveniente provavelmente da desaparecida capela de Santa Efigénia, e de grande devoção em terras africanas e brasileiras. Santa Efigénia está representada com hábito carmelita, segurando uma igreja em chamas – alusão ao milagre de ter livrado o seu convento de incêndio.
Destaca-se ainda o púlpito, com balaústre de madeira, tendo na parte superior da parede uma estrela – provável símbolo mariano.
O arco triunfal está totalmente revestido de azulejos azuis e brancos, com cenas alusivas à invocação da igreja: do lado direito, O Milagre da Senhora da Nazaré - observando-se distintamente D. Fuas Roupinho com o cavalo suspenso sobre o abismo; e, do lado esquerdo, Nossa Senhora entronizada rodeada por devotos. Estes painéis foram colocados em 1942, substituindo os antigos que se encontravam bastante danificados.
Os dois retábulos colaterais estão dedicados a Nossa Senhora de Fátima e ao Sagrado Coração de Jesus. Integram colunas torsas e elementos decorativos em talha dourada.
Na capela-mor, preside a Padroeira, imagem original, restaurada. O retábulo, também o original restaurado, inclui três pares de colunas torsas. As paredes estão totalmente revestidas com painéis de azulejos, alusivos aos milagres de Nossa Senhora da Nazaré, e reconstituídos na década de 70 do século XX.
Destaca-se também o grande lampadário e a cruz processional.
Segundo os relatos coevos, é na capela-mor que se encontra enterrada a cabeça do Rei do Congo, D. António I.
III . OS PAINEÍS DE AZULEJOS DA CAPELA-MOR
Os painéis que actualmente se encontram na capela-mor da igreja, são cópias provavelmente realizadas durante os restauros da década de 1970. Estão muito simplificadas relativamente aos originais, tendo desaparecido o extraordinário enquadramento barroco e alguns pormenores importantes, nomeadamente da célebre batalha de Ambuíla.
Dois painéis de azulejos alusivos a milagres atribuídos à poderosa intercessão de Nossa Senhora da Nazaré encontram-se à entrada da capela-mor, motivo da construção desta capela por Vidal de Negreiros: do lado esquerdo, Invocação à Virgem da Nazaré e, do lado direito, Milagre do Naufrágio.
Os dois grandes painéis laterais são de grande valor iconográfico e documental. Foram realizados após a Batalha de Ambuíla de 29 de Outubro de 1665, um dos maiores reencontros guerreiros em terras africanas, determinante para o Reino do Congo e futuro de Angola.
No painel da Batalha de Ambuíla, permanece o plano geral da peleja, tendo ao centro o quadrado das forças portuguesas em fileiras dobradas, envolvidas pelo grande exército congolês. Ambas as forças, constituídas na sua maior parte por guerreiros africanos, segundo as fontes históricas, apresentam bandeiras e estandartes. No canto superior direito encontra-se a imagem de Nossa Senhora da Nazaré, a cuja intercessão foi atribuída a vitória.
No painel das Insígnias do Rei do Congo, também representado de forma muito simplificada, destaca-se: a cabeça do rei do Congo D. António I – rei Nvita-a-Nkanga -, morto durante a batalha de Ambuíla, e aqui enterrada solenemente com todas as honras; o trono, o brasão com cinco [braços armados com] espadas, em sautor; a coroa e a lança real.
IV . NOSSA SENHORA DA NAZARÉ
A invocação de Nossa Senhora da Nazaré tem origem em Portugal. Segundo a tradição, no século IV, uma pequena imagem da Virgem foi levada de Nazaré na Galileia para Belém, depois para o Norte de África e chegando finalmente ao ocidente da Península Ibérica. Aqui, foi escondida numa reentrância da rocha nas proximidades do actual Sítio da Nazaré, até à sua descoberta em 1182. Nesta data, o alcaide D. Fuas Roupinho, em sinal de agradecimento por ter sido salvo de cair no despenhadeiro quando perseguia um veado, mandou erguer uma ermida dedicada a Nossa Senhora da Nazaré. Posteriormente foi edificada a igreja do Santuário, com alpendres destinados aos romeiros.
O culto expandiu-se por todo o mundo, durante a época dos descobrimentos portugueses, sendo a Senhora da Nazaré frequentemente invocada nos perigos no mar. Em Angola, o culto foi introduzido pelo governador Vidal de Negreiros.
O Santuário de Nossa Senhora da Nazaré em Luanda transformou-se rapidamente em centro de peregrinação e devoção mariana, e, desde então, não cessaram as notícias de graças concedidas pela poderosa intercessão da Mãe de Deus.
Iconograficamente Nossa Senhora da Nazaré é representada com coroa e com o Menino ao colo.
A festa litúrgica realiza-se a 8 de Setembro e inclui a tradicional procissão de velas.
Referências:
- CUNHA, Mons. Alves da, Ermida de Nossa Senhora da Nazaré, O APOSTOLADO, ano XV, nº 768, de 28-10-1950
- BATALHA, Fernando, A Ermida de Nossa Senhora da Nazaré, O Turismo, Luanda, 1968, ano 1, nº 2.
- MACHADO, M.ª Antónia Graça Saavedra, MACHADO, João L. Saavedra, Nossa Senhora da Nazaré na Iconografia Mariana, Museu da Nazaré, 1982.
- MATTOSO, José (dir.) - Património de Origem Portuguesa no Mundo, arquitectura e urbanismo: África, Mar Vermelho e Golfo Pérsico. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.
Nota: Texto e Fotografia: ACDA (Associação de Cultura e Desenvolvimento de Angola)
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