Igreja de São Domingos, Viana do Castelo


Nesta página: 

I . História

II . Descrição

III . Nossa Senhora de Monserrate: culto e iconografia

IV . São Bartolomeu dos Mártires

V . A Ordem de São Domingos

 

I . HISTÓRIA

Em 1560, D. Frei Bartolomeu dos Mártires (1514-1590), Arcebispo de Braga, decidiu fundar um convento dominicano em Viana da Foz do Lima, rica e movimentada vila portuária. Começou a ser edificado em 1563, com projecto inicial atribuído a Frei Julião Romero, sendo lançada solenemente a primeira pedra da igreja de Santa Cruz, a 22 de Janeiro de 1566.

Em 1571, a capela-mor estava concluída, sendo aberta ao culto a 4 de Agosto do mesmo ano. Nas décadas seguintes, foram edificadas as capelas laterais, por iniciativa de prestigiadas famílias vianenses.

Ao longo do século XVIII, a igreja foi enriquecida com o empenho de vianenses e artistas nortenhos, sendo erguida a torre sineira (1707) e substituídos os retábulos da capela-mor e do altar de Nossa Senhora do Rosário.

Com a extinção das ordens religiosas em 1834, o convento foi ocupado por diversas instituições públicas, transformando o local num dos principais centros da cidade.

Em 1910, a igreja de Santa Cruz – também chamada de São Domingos - foi classificada como Monumento Nacional, e, em 1964, fixada por Portaria, Zona Especial de Protecção.

Em 1936, a igreja passou a Paroquial de Nossa Senhora de Monserrate.

Um incêndio de grandes proporções deflagrou em Junho de 1938, destruindo grande parte do edifício conventual.

Em 1977, instalaram-se os Serviços Centrais da Cúria Diocesana no antigo convento, entretanto remodelado.

A igreja de São Domingos, herdeira das memórias vivas de pescadores, navegadores e mercadores, e lugar de devoção a São Bartolomeu dos Mártires, é actualmente um dos principais centros de convergência cultural e religiosa, da cidade de Viana do Castelo.



II . DESCRIÇÃO

A igreja de São Domingos de Viana do Castelo é um dos templos mais imponentes desta cidade.

A original fachada retabular, do mestre João Lopes-o-Moço (1576), contrasta com a simplicidade do conjunto. Ao centro, Nossa Senhora do Rosário está ladeada por São Domingos e São Tomás de Aquino. Os quatro Evangelistas circunscrevem o óculo oval e, no frontão, destaca-se o brasão de São Bartolomeu dos Mártires. Ladeando o pórtico estão as imagens de São Pedro e São Paulo.

Do lado esquerdo, ergue-se a torre sineira, setecentista. Na cabeceira, destacam-se os grandes torreões cilíndricos, outrora marcos da navegação costeira.

No antigo convento, com possantes contrafortes nas fachadas laterais, assinala-se a janela da cela de São Bartolomeu dos Mártires, com brasão e inscrição.

O interior da igreja é espaçoso e de grande riqueza em talha dourada, assim como as amplas capelas laterais intercomunicantes.

Do lado esquerdo, a capela de Nossa Senhora dos Mares foi mandada construir por Gaspar Pinto Correia em 1613 e, em 1620, adquirida por Francisco Martins Viana, conforme inscrição. Tem um notável retábulo pintado e dourado pelo mestre Constantino Leitão (1621), com imagem de Nossa Senhora dos Mares, de grande veneração das gentes da Ribeira; nas cartelas laterais estão representadas cenas invulgares do Antigo Testamento – Transporte da Arca da Aliança e Exploradores de Canaã -, e na predela baixos-relevos com cenas alusivas à Entrada da Barra de Viana; no frontão está representada A Coroação da Virgem. A pia baptismal, do lado esquerdo, é proveniente da antiga igreja de Monserrate. Neste espaço encontra-se a imagem de São Pedro com os atributos – chave e rede de pescador.

A capela de Nossa Senhora da Soledade, inicialmente dedicada a São Jacinto, foi instituída, em 1618, por João da Guarda Maciel e sua mulher Maria Fernandes Guedes. O retábulo tem pinturas de cariz popular, com cenas da vida da Virgem – A Anunciação, A Visitação e A Dormição. Tem, na base, duas placas com inscrições latinas referentes à Virgem Dolorosa: Uma Espada Trespassará a Tua Alma e Grande como o Mar é a Tua Dor.

Uma notável escultura de São Lourenço está colocada neste espaço.

A capela do Senhor dos Passos, instituída por Rui de Sá Sottomayor (1611), tem no retábulo (final do século XVII), Jesus com a Cruz aos ombros, e, lateralmente, telas com cenas da Paixão: A Agonia do Senhor no Horto e o Calvário.

Do lado direito da nave, a capela de Nossa Senhora da Conceição foi restaurada na segunda metade do séc. XIX. Tem ao centro a imagem da Padroeira, e lateralmente Santa Rosa de Lima e Santa Joana Princesa. A pintura do frontão representa São Pedro.

A capela de Nossa Senhora de Fátima, com a invocação inicial de São Francisco, foi instituída em 1608 por Francisco da Rocha Páris e sua mulher Maria Fernandes Peixoto, e adquirida em 1821 pelo comerciante vianês Joaquim dos Santos Lomba. No frontão, mantém o emblema da ordem franciscana.

Destacam-se nas paredes laterais, o brasão dos Rocha Páris e inscrição relativa à instituição da capela; e duas inscrições referentes a Joaquim dos Santos Lomba.

A capela do Sagrado Coração de Jesus, tem um notável retábulo em talha dourada, proveniente da igreja de Nossa Senhora de Monserrate, com as imagens, ao centro, do Sagrado Coração e Santa Margarida Maria Alacoque. Lateralmente, tem imagens de Nossa Senhora com o Menino e São Domingos. Nas paredes laterais estão as Promessas do Sagrado Coração de Jesus e os Pedidos do Imaculado Coração de Maria aos Pastorinhos de Fátima.

No transepto, encontra-se a admirável capela de Nossa Senhora do Rosário, instituída por Frei Cristóvão de Brito em 1615, com a respectiva Confraria. No magnífico retábulo em talha dourada, de José Álvares de Araújo (1762) e desenho de André Soares (1720-1769), preside Nossa Senhora do Rosário (século XVII), ladeada por pinturas representando a Anunciação e A Visitação; na parte superior, A Assunção. O sacrário está totalmente integrado no desenho do retábulo e o altar evidencia a riqueza do conjunto.

A capela de São José - inicialmente dos Santos Reis -, foi adquirida por Gaspar Caminha Rego, negociante vianês, em 1650, conforme inscrição e brasão no pórtico. No retábulo, preside São José com o Menino; no frontão está representada A Estrela de Belémpossivelmente da primitiva invocação. Está ladeado pelas imagens do Divino Reizinho e Nossa Senhora Menina.

Do lado esquerdo, encontram-se dois retábulos em talha dourada, do século XVII, provenientes da antiga igreja de Monserrate: o altar de Nossa Senhora de Monserrate, Padroeira da Paróquia, com a venerável e tradicional imagem da Virgem com o Menino Jesus e, no frontão, Santo António; e o altar de Santa Teresinha do Menino Jesus com representação de São João da Cruz (?).

O notável altar de Nossa Senhora das Dores – ou do Bom Jesus -, foi edificado por Baltazar Jácome do Lago em 1605. Destacam-se as imagens de Cristo Crucificado e de Nossa Senhora das Dores; e, no frontão, a imagem de Cristo encimado pelo pelicano, em cartela sustentada por dois Anjos. Na parede lateral encontra-se a arca tumular de Baltazar Jácome do Lago.

No cruzeiro, a mesa de altar em talha dourada tem a representação da Última Ceia, em baixo-relevo; lateralmente, está colocada uma escultura recente de São Bartolomeu dos Mártires.

Na capela-mor, o magnífico retábulo em talha dourada, é de Ambrósio Coelho (1727). O sacrário tem representada a Santa Cruz entrelaçada de rosas, rodeada de anjos e coroada. As colunas e arcos estão profusamente decorados, e integram lateralmente as imagens de São Domingos e São Francisco. Destacam-se singulares cariátides na base do trono e, no remate, Cristo Ressuscitado também rodeado de anjos.

O túmulo de São Bartolomeu dos Mártires, contíguo ao altar-mor, foi mandado edificar em 1607, por D. Jorge de Ataíde, Bispo de Viseu. Sobre o túmulo encontra-se o epitáfio, o retrato do Santo Arcebispo, de António Maciel (1609), e, no frontão, as armas com o lema.

Na abóbada, está representada A Virgem Maria entregando o Rosário a São Domingos. As paredes laterais, revestidas de azulejo de padrão, integram dois painéis monocromáticos com A Instituição da Sagrada Eucaristia e A Procissão do Corpo de Deus. Destaca-se também o notável órgão barroco e o antigo cadeiral dos Frades Dominicanos.

No coro-alto, com o brasão de D. Frei Bartolomeu dos Mártires na balaustrada, encontra-se o órgão datado de 1818 e intervenção do famoso organeiro Augusto Joaquim Claro (1865-1917).

Na Sacristia, um grande arcaz preenche a parede lateral. Ao centro, está um retábulo em talha dourada, com Cristo Crucificado e a Senhora das Dores, ladeado por pinturas representando a Virgem e São João Evangelista; imagens de São Domingos e São Gonçalo e, no remate cartela com Cristo coroado de espinhos.

A Sala de Exposição integra espólio de Arte Sacra associado a São Bartolomeu dos Mártires, que faleceu neste convento. Destaca-se também o retábulo com A Adoração dos Pastores, São Francisco e Santa Genebra.

No claustro, estão expostas pedras tumulares brasonadas e a imagem em pedra de Nossa Senhora de Monserrate.

No espaço conventual mantém-se a cela de São Bartolomeu dos Mártires - actualmente capela. O tríptico, de António Maciel (c.1582), representa as três grandes devoções do Santo Arcebispo – A Santa Cruz, o Apóstolo São Bartolomeu e São Domingos.



III . NOSSA SENHORA DE MONSERRATE: CULTO E ICONOGRAFIA

A invocação é originária da Catalunha, da região dos montes serrados – Mont Serrat -, onde, segundo a tradição, a imagem da Virgem foi encontrada no século IX, difundindo-se a devoção por toda a Espanha e regiões vizinhas. De Portugal, foi levada para o Brasil e terras do Oriente.

Com o desenvolvimento e a prosperidade da Vila de Viana da Foz do Lima - região com fortes ligações à Catalunha -, durante os séculos XV e XVI, também se incentivou a devoção à Virgem de Monserrate. Em 1590, mercadores vianenses mandaram esculpir uma imagem de Nossa Senhora à imitação da que se venera na Catalunha e instituíram a respectiva Irmandade. Em 1601, os confrades iniciaram a edificação de um templo próprio, que, em 1621, foi erigido em sede da nova paróquia, pelo Arcebispo D. Afonso Furtado de Mendonça (1561-1630), abrangendo os bairros da Ribeira e a zona onde se implantara o convento de Santa Cruz. D. José de Menezes (1692-1696) entronizou a imagem de Nossa Senhora de Monserrate no novo retábulo – actualmente na igreja de São Domingos.

Em 1836, o Governador Civil promoveu a transferência da sede da Paróquia de Monserrate para a igreja do convento dominicano, entretanto extinto. A antiga igreja foi demolida em 1916.

A devoção à Senhora de Monserrate manteve-se viva na cidade de Viana do Castelo, associada de modo particular às festividades marítimas.

Na iconografia portuguesa, a Virgem de Monserrate é representada em trono com o Menino Jesus no braço esquerdo, e dois Anjos serrando o monte – alusão à origem catalã desta invocação.

A festa litúrgica é celebrada em Janeiro.


IV . SÃO BARTOLOMEU DOS MÁRTIRES

Bartolomeu Fernandes nasceu em Lisboa em 1514. Em 1528, ingressou na Ordem dos Pregadores (Dominicanos), tomando o nome de Mártires, em memória da paróquia de Baptismo.

Em 1559, foi consagrado Arcebispo Primaz de Braga, tendo como lema Arder e iluminar Não vos conformeis com este mundo. Entre 1561 e 1563, participou activamente no Concílio de Trento, trabalhando arduamente na prossecução das reformas tridentinas e empenhando-se no cuidado e assistência espiritual e material dos fiéis da vastíssima diocese. Mestre insigne de cultura e espiritualidade, foi particularmente solícito na orientação e formação do clero.

Em 1582, renunciou ao arcebispado e recolheu-se ao convento dominicano da Santa Cruz, por ele fundado em Viana do Castelo. Foi apelidado pelos Vianenses, especialmente pela gente do mar, como o Arcebispo Santo Pai dos Pobres e dos Enfermos.

Faleceu em 16 de Julho de 1590 com fama de santidade. Foi sepultado na capela-mor da igreja do seu amado convento em Viana do Castelo. A 5 de Julho de 2019 foi promulgado o Decreto de Canonização pelo Papa Francisco.

Iconograficamente é representado com o hábito dominicano, a cruz arquiepiscopal, o crucifixo, a mitra e o báculo.

A festa litúrgica celebra-se a 18 de Julho.


V . A ORDEM DE SÃO DOMINGOS

A Ordem dos Pregadores - Ordo Praedicatorum -, foi fundada por São Domingos de Gusmão em 1216, com a missão de levar a Palavra de Deus a todo o mundo. Em Portugal, o primeiro convento dominicano foi fundado em 1218, sendo erigida a Província Dominicana portuguesa em 1418

Os Dominicanos distinguiram-se nos estudos teológicos, nomeadamente com São Tomás de Aquino. No século XV e XVI, a Ordem Dominicana esteve particularmente ligada aos estudos universitários em Portugal e acompanhou a expansão portuguesa em África e no imenso Oriente. Em todos os locais foram instituídas Confrarias do Rosário, devoção particularmente ligada a São Domingos.

Na sequência do decreto governamental de 1834, foram extintos todos os conventos em Portugal. A Ordem Dominicana foi restaurada no início do Século XX.

O santoral dominicano inclui vultos de renome, com representação na igreja de Viana do Castelo, nomeadamente: São Domingos, São Tomás de Aquino, São Gonçalo de Amarante, Santa Joana Princesa, Santa Rosa de Lima e, particularmente, São Bartolomeu dos Mártires.

 

Referências

  • CAMPOS, Leandro Ramos, Estudo Monográfico de Monumentos do Centro Histórico de Viana do Castelo, Faculdade de Letras, Universidade do Porto, 2018
  • SOUSA, Fr. Luís de, Vida de Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, Liv. Sá da Costa, Lisboa, 1946.
  • CARDONA, Paula Cristina Machado, Confrarias em Viana do Castelo. A encomenda artística dos séculos XVI a XIX, Edições Afrontamento, 2012
  • ROLO, Pe. Fr. Raúl de Almeida (Coordenação), Frei Bartolomeu dos Mártires (1514-1590), Biblioteca Nacional, 1991

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