A Sé de Leiria


Nesta página: 

I . História

II . Descrição

III . Nossa Senhora da Assunção

IV . Diocese de Leiria-Fátima: resumo histórico

 

I . HISTÓRIA

A Catedral de Leiria foi construída após a criação da nova diocese. Em 1546, D. Frei Brás de Barros, primeiro bispo da recém-criada diocese de Leiria, fez diligências junto de D. João III para que se edificasse uma igreja "conueniente em lugar homde commodamente e com menos opresam" os fiéis pudessem assistir aos ofícios litúrgicos.

Os trabalhos de construção da catedral iniciaram-se em Agosto de 1559, segundo planos do arquitecto Afonso Álvares (m. 1580). Foi sagrada em 1574 sob invocação de Nossa Senhora da Assunção, no bispado de D. Frei Gaspar do Casal (1557-1579), que muito contribuiu para a sua edificação.  A direcção das obras foi assumida provavelmente por Baltazar Álvares (1560-1630) e Frei João Turriano (1610-1679).

A Sé foi sagrada solenemente em 1574, por D. Frei Gaspar do Casal, estando as obras concluídas na sua generalidade.

O esforço e cuidado dos vários Bispos que depois sucederam, muito valorizaram a Catedral de Leiria,  nomeadamente: D. Pedro de Castilho (1583-1604) mandou fazer o grande adro, a escadaria e o claustro com a notável sacristia; sendo bispo D. Martim Afonso Mexia (1605-1615), foram concluídos os retábulos da capela-mor e da capela do Santíssimo; o cadeiral dos cónegos foi encomenda de D. Frei António de Santa Maria (1616-1623); e, com D. Álvaro de Abranches e Noronha (1694-1746), foi encomendada a tribuna para o órgão ao mestre entalhador José Gomes (m. c. 1750).

O terramoto de 1755 provocou sérios danos na Sé, nomeadamente na fachada principal.  O seu restauro foi iniciado em 1756 por D. Frei João de Nossa Senhora da Porta (1746-1760), e continuado pelo seu sucessor D. Frei Miguel de Bulhões e Sousa (1761-1779). A frontaria foi profundamente modificada, perdendo a sua feição original e sendo remodelada ao modo da época. No interior, foram também instaladas as tribunas dos órgãos na capela-mor e construída a nova sacristia. A torre sineira, edificada separada da igreja, foi erguida na encosta do castelo - provavelmente para que o toque dos sinos se pudesse ouvir amplamente na cidade.

Após as obras de beneficiação, a catedral foi solenemente sagrada em 24 de Julho de 1791.

O incêndio provocado pela invasões francesas (1808-1811) levou à destruição parcial do interior da igreja, nomeadamente a capela-mor e os preciosos arquivos da Sé. O restauro do templo foi levado a cabo nos anos seguintes por D. Manuel de Aguiar (1790-1815), e também a execução de um novo órgão por Joaquim António Peres Fontanes (1750-1818) - posteriormente colocado no Santuário próximo de Nossa Senhora da Encarnação.

Em 1907, no período em que a diocese esteve extinta, foram trasladados, do antigo Cemitério da Sé para a igreja, os restos mortais de notáveis bispos. Também em 1969, foram trasladados para o transepto da igreja os restos mortais de outros insignes bispos da diocese, nomeadamente de D. Frei Miguel de Bulhões e Sousa.

Todo o conjunto da Sé de Leiria, incluindo o Adro, o Claustro, a Torre Sineira e a Casa do Sineiro, foi classificado como Monumento Nacional em 2014.



II . DESCRIÇÃO

A Catedral de Leiria, construída entre o Castelo e a parte baixa da cidade, sobre uma grande plataforma é de grande monumentalidade.

A escadaria, com perfil contracurvo, dá acesso ao amplo adro, delimitado por balaustrada em pedra lioz, com indicação, num dos muros, da data de construção (1618):

"ESTA RUA HE DA FA / BRICA DA SÉ QUE / CÕPROU O CHÃO E A / MANDOU FASER A SUA / CUSTA 1618".

A imponente fachada principal, restaurada em 1756, tem três corpos demarcados por fortes pilastras, onde se destacam os portais e os grandes janelões emoldurados. Tem a particularidade de não ter a torre sineira integrada...

O interior é de surpreendente monumentalidade, harmonia de proporções, leveza e sobriedade. Tem três grandes naves, erguidas à mesma altura, o que lhe confere uma particular espacialidade. As abóbadas, assentes em sólidos pilares, de secção cruciforme, têm no fecho inscrições com várias datas – 1570, 1571, 1572, 1766, …- provavelmente os anos em que foram construídas ou restauradas.

À entrada, encontra-se o guarda-vento (2) em talha, com decoração fitomórfica. Do lado esquerdo, no Baptistério (3), de abóbada de nervuras, destaca-se a pia baptismal, monolítica, em calcário, mandada colocar por D. Pedro de Castilho. Duas originais pias de água-benta, também adquiridas por D. Pedro de Castilho em 1603, encontram-se junto aos pilares do primeiro tramo.

O transepto é também coberto por abóbada de nervuras. No topo esquerdo encontra-se o Altar de Nossa Senhora da Conceição (4). No nicho, destaca-se a imagem de Nossa Senhora da Conceição em baldaquino – esta imagem tem a particularidade de ter servido como primeira evocação figurativa de Nossa Senhora de Fátima que circulou na Cova da iria, numa altura em que o cânone iconográfico ainda não tinha surgido.

Ladeando o retábulo, estão lápides com inscrições relativas aos bispos D. João Inácio da Fonseca Manso (1818-1834) e D. Pedro Vieira da Silva (1670-1676) e, na parede esquerda, de maior dimensão, D. Manuel de Aguiar (1790-1815); o desenho das lápides é de Ernesto Korrodi (1870-1944). No lado direito do altar, encontra-se uma imagem de S. José com o Menino.

No topo direito, está o Altar do Sagrado Coração de Jesus com a imagem do Sagrado Coração de Jesus. No fecho do retábulo destaca-se um coração inflamado sobre escudo português e, na base, também a coroa real. Nas paredes laterais, encontram-se também lápides com inscrições - desenho igualmente de Ernesto Korrodi - relativas aos bispos D. António Pinheiro (1579-1582), D. Lourenço de Lencastre (1780-1790) e, na parede direita, também de maior dimensão, D. Fr. Miguel de Bulhões e Sousa (1761-1779).

Na Capela do Santíssimo (6), destaca-se o trono eucarístico com baldaquino em talha dourada. O remate tem a representação do Agnus Dei sobre resplendor, também em talha dourada. Sobre o pórtico de entrada, salienta-se a pintura da Adoração do Santíssimo Sacramento, encimada por uma alegoria à Igreja.

Uma lápide evocativa da restauração da diocese em 1918, pelo Papa Bento XV, encontra-se no pilar entre a capela do Santíssimo e a capela-mor:

BENEDICTUS P. P. XV DIOCESIM LEIRENEM ITERUM CONSTITUIT ANNO D. MCMXVIII.

Encontram-se no ângulo da nave Norte com o transepto, na antiga capela de São Bento, as lápides sepulcrais de personalidades ilustres de Leiria – D. Mariana de Sousa de Castelo Branco e Jorge da Silva da Costa de Ataíde e sua mulher, D. Brites de Sousa Currutelo.

A Capela do órgão tem sobre o pórtico de entrada, a pintura da Ressurreição encimada por uma alegoria à Santa Cruz, possível alusão à anterior invocação desta capela - Nossa Senhora das Dores. Integra o Grande Órgão da Sé, do organeiro alemão Georges Heintz, inaugurado em 1997.

Na Capela – mor, destaca-se o grandioso retábulo atribuído a Simão Rodrigues (1560-1629). Todo o conjunto de talha, escultura e pintura do início do século XVII, impõe-se pela sua grande beleza, harmonia e monumentalidade, particularmente valorizado por permanecer no contexto original.

É composto por três níveis, tendo ao centro representada A Assunção da Virgem, Padroeira da Catedral; no nível inferior, encontra-se um Crucifixo do século XVIII, em substituição do painel original que representava a Adoração dos Pastores e destruído durante as Invasões Francesas; subsiste a invocação GLORIA IN EXCELSIS DEO (Glória a Deus nas Alturas), possivelmente uma reminiscência desta representação.

Lateralmente, encontram-se quatro nichos com esculturas, atribuídas a Gonçalo Rodrigues (c. 1550-c. 1620), dos evangelistas São Mateus e São Marcos, São João e São Lucas, com os respectivos atributos na parte inferior.

No remate, o tondo tem a representação da Coroação de Nossa Senhora pela Santíssima Trindade, ladeado por pinturas dos Apóstolos São Pedro e São Paulo. Na parte inferior do retábulo encontram-se dois medalhões representando Cristo e a Virgem das Dores.

Nesta capela, encontra-se ainda o notável cadeiral em pau-santo com duas ordens de cadeiras; as tribunas; e os órgãos - actualmente desactivados -, com decoração barroca e escudo de D. Frei Miguel de Bulhões e Sousa.

A Sacristia, edificada nas décadas finais do século XVI, é um dos conjuntos mais admiráveis da Sé.

As paredes estão revestidas de azulejos de padrão polícromo e o tecto em abóbadas de nervuras tem pintura de brutesco em tons rosa, azul e dourado, integrando com harmonia todo o espaço envolvente.

Destaca-se o monumental lavabo em mármore polícromo, em tonalidades de rosa e azul, sendo possivelmente a peça mais notável da sacristia.

A tabela rectangular no remate tem cartela com inscrição: “FLEVIT AMARE VT LACHRIMA LAVARENTUR DELICTVM TV SIMILITER LACHRIMIS DILME CVLPAM. NON INVENIO QVID DIXERIT SED QVOD FLEVIT” (Chorou amargamente para que as lágrimas lavassem o delito. Tu, do mesmo modo, com lágrimas apaga a culpa. Não acho o que terá dito, mas o que chorou)

Do lado oposto, encontra-se a capela do Santíssimo Sacramento com estrutura semelhante, enquadrando um Crucifixo. Tem também tabela rectangular no remate com inscrições: “VT POSSIS BENE VIVERE DISCE MORI” (Para poderes viver bem, aprende a morrer); "QVI CVSTODIT OS SVVM CVSTODIT ANIMAM SVAM QVI AVTEM INCONSIDERATVS EST AD LOQVENDVM SENTIET MALA PROVERB - CAP. 13". (Quem vigia a sua boca guarda a sua vida; o que é imponderado no falar, busca a sua ruína, Provérbios 13.3)

Destaca-se ainda o mobiliário dos alçados laterais, nomeadamente o admirável arcaz em pau santo, e um conjunto de pinturas, incluindo a Adoração dos Pastores atribuída a Amaro do Vale (m. 1619).

O Claustro, edificado, no final do século XVI, tem planta quadrangular e galerias cobertas por abóbadas de caixotões. As armas de D. Frei Miguel de Bulhões e Sousa são visíveis sobre uma das portas.

A Torre Sineira foi erguida sobre uma das torres medievais junto a uma das antigas portas da muralha do castelo - a Porta do Sol. A porta que lhe estava anexa foi alargada e sobre ela construída a Casa do Sineiro, utilizada até 1970.

Tem o coruchéu bolboso encimado por catavento metálico com figura de anjo, e também a pedra de armas de D. Miguel Bulhões e Sousa.

O mecanismo do relógio é de grande valor patrimonial. O sino mais antigo tem a data de 1772 com assinatura de André Aregos. O sino maior tem a inscrição SENDO Bº DESTA CID. E DE LRª O EXMº E REMº SR. D. MANOEL DE AGUIAR FOI FEITO ESTE SINO E TODO O INSTRUMENTO DESTA TORRE EM 8.ª POR JOÃO CRAVEIRO NO ANO DE 1801. Ao lado encontra-se a conhecida Casa do Sineiro.



III . NOSSA SENHORA DA ASSUNÇÃO

Portugal possui um legado mariano riquíssimo, com forte cunho popular. A Solenidade da Assunção é uma das festas mais antigas do calendário litúrgico. Adquiriu particular relevo em 1385, com a vitória portuguesa na batalha de Aljubarrota, na véspera desta solenidade, tendo D. João I ordenado que todas as catedrais do reino fossem dedicadas a Nossa Senhora da Assunção.

A festa da dedicação da Catedral de Leiria celebra-se a 13 de Julho, memória da Sagração da Sé em 1574.


IV . DIOCESE DE LEIRIA-FÁTIMA: RESUMO HISTÓRICO

A antiga cidade Romana de Collipo – actual Leiria -, foi conquistada pelos Suevos e Visigodos, depois ocupada pelos muçulmanos e finalmente conquistada por D. Afonso Henriques em 1135. Este mandou edificar um castelo e a primeira igreja intramuros, dedicada a Santa Maria da Penha – ou Pena. Leiria ficou subordinada ao mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, por doação régia.

A Diocese de Leiria foi criada por Bula do Papa Paulo III em 22 de Maio de 1545, a pedido de D. João III, tendo sido nomeado primeiro bispo D. Frei Brás de Barros, com sede na igreja de Nossa Senhora da Pena. No mesmo ano, a 13 de Junho, Leiria foi elevada à categoria de cidade, por decreto régio. Terminada a construção da nova catedral em 1574, nela se instalou o cabido.

No século XIX, iniciou-se um período conturbado na história desta diocese, marcado pelas invasões francesas (1807-1811) que atingiram duramente a região, provocando a destruição e desolação em todas as freguesias - na obra de reconstrução destacou-se particularmente D. Manuel de Aguiar, um dos mais ilustres bispos de Leiria. O período foi marcado também pela guerra civil, pela extinção do bispado em 1882, e pelas perturbações provocadas pela implantação da República.

As Aparições de Fátima em 1917 contribuíram de forma especial para uma nova fase de desenvolvimento na região. A 17 de Janeiro de 1918 a Diocese de Leiria foi restaurada pelo Papa Bento XV, sendo nomeado bispo D. José Alves Correia da Silva (1920- 1957).

Por Breve do Papa João XXIII, Nossa Senhora de Fátima foi declarada Padroeira da Diocese de Leiria, tendo Santo Agostinho como co-Padroeiro. A 13 de Maio de 1984, a diocese passou a designar-se de Leiria-Fátima, por Bula do Papa João Paulo II.

 

REFERÊNCIAS:

  • JORGE, Virgolino Ferreira, A Catedral de Leiria. Contexto Histórico-arquitectónico, Catedral de Leiria. Leiria: Diocese de Leiria-Fátima. 2005
  • CRISTINO, Luciano Coelho, A Diocese de Leiria-Fátima. Catedral de Leiria. Leiria: Diocese de Leiria-Fátima. 2005
  • BRANCO, Ricardo Lucas, O projecto da Catedral de Leiria no tempo da Reforma Católica: As intervenções de Afonso e Baltazar Álvares, Leiria: Diocese de Leiria-Fátima, 2020.

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