Igreja Paroquial de São Bartolomeu do Beato (Lisboa)


Nesta página: 

I . O Sítio do Beato

II . História

III . Descrição

IV . Ordem dos Agostinhos Descalços

V . São Bartolomeu

VI . O Beato Frei António da Conceição

 

I . O SÍTIO DO BEATO

A zona oriental de Lisboa foi desde sempre considerada um dos lugares mais aprazíveis da cidade.

No século XV, foi construída uma ermida com o orago de São Bento, entregue à Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista – vulgarmente conhecidos por Loios.

Em 1592, sob o impulso do Padre Frei António da Conceição – o insigne Beato António (1522-1602) -, iniciou-se a construção do Convento de São Bento de Xabregas. Ficou na tradição oral do lugar o modo como este venerável Padre conseguiu angariar a quantia necessária para erguer uma das maiores casas conventuais de Lisboa, conhecida, a partir de então, como Convento do Beato.

Com o terramoto de 1755, foi grande a afluência das pessoas vindas das zonas mais atingidas da cidade. Ficou célebre no lugar, a invocação de Nossa Senhora das Barraquinhas, alusiva aos bairros de emergência improvisados no período após o terrível evento.

Em 1770, foi transferida para o sítio, a antiquíssima Paróquia de São Bartolomeu, com sede na igreja do Convento do Beato.

Com o decreto de extinção das Ordens religiosas, em 1834, a sede da paróquia foi transferida novamente para a igreja do antigo convento dos Agostinhos Descalços, constituindo-se a Paróquia de São Bartolomeu do Beato, no antigo lugar do Grilo.


II . HISTÓRIA

A 15 de Maio de 1666, foi lançada, com grande solenidade, a primeira pedra do convento dos Agostinhos Descalços por D. Afonso VI, com projecto de João Nunes Tinoco (c. 1616-1690). O convento teve a invocação de Nossa Senhora da Conceição do Monte Olivete, designação derivada de uma imagem de Nosso Senhor no Horto [das Oliveiras] existente numa capelinha do lugar do Grilo, junto a Xabregas.

A 23 de Outubro de 1683, um incêndio violento destruiu grande parte da igreja e do edifício conventual. No ano seguinte, a igreja foi possivelmente reedificada e o convento ampliado. A consagração do altar-mor foi realizada no dia 19 de Abril de 1739, por D. Frei Leandro da Piedade (†1740). O terramoto de 1755 causou apenas alguns danos.

Depois da extinção das Ordens religiosas em 1834, instalou-se no antigo convento o Recolhimento de Nossa Senhora do Amparo, e a anterior igreja conventual passou a sede da Paróquia de São Bartolomeu do Beato. O culto só foi efectivado em 1930.

Do antigo convento de São Bento de Xabregas, foram trasladadas as relíquias do Venerável Padre Frei António da Conceição (o Beato António). Também deste convento, e do extinto convento das Grilas, situados na proximidade, são provenientes algumas imagens e alfaias litúrgicas.



III . DESCRIÇÃO

A igreja do antigo Convento dos Eremitas Descalços de Santo Agostinho situa-se em local com vista privilegiada para o Tejo, constituindo referência arquitectónica e religiosa da zona oriental de Lisboa. O conjunto monumental mantém em geral a estrutura primitiva. No antigo Convento dos Grilos, com amplo adro, destaca-se a antiga portaria.

Uma grande escadaria dá acesso à antiga igreja agostiniana com torre sineira relativamente recuada.

A fachada monumental tem no frontão simbologia mariana - Sol e Lua com Coroa - da primitiva fundação. Na galilé, de três arcos, destaca-se a simbologia agostiniana no portal de entrada. Neste espaço, encontra-se o sino proveniente do antigo Convento do Beato, com inscrições: REVERENDISSIMUS PATER MAGISTER DIDACVS AB ANGELIS (Reverendíssimo Pai e Mestre Diogo dos Anjos) e LUDOVICUS GOMES DE OLIVA FECIT MIHI ANNO DOMINI 1636 (Luís Gomes de Oliveira me fez no ano do Senhor de 1636).

O interior, espaçoso e sóbrio, tem excelente iluminação natural.

À entrada, encontra-se a capela baptismal, bem integrada no conjunto arquitectónico.

A nave tem cobertura de abóbada e grandes janelas iluminantes, destacando-se os dois púlpitos decorados com estrelas e Cruz de Cristo, e, no interior dos baldaquinos, o símbolo da Santíssima Trindade.

As seis capelas laterais da nave, intercomunicantes, têm grades de madeira entalhada, e as invocações primitivas representadas na talha e nos azulejos.

A capela do Senhor dos Passos tem, além da imagem desta invocação, uma escultura jacente do Senhor Morto. Integrada neste espaço encontra-se uma notável imagem de São João Evangelista - proveniente do antigo Convento do Beato.

A capela de Nossa Senhora do Carmo e de Santo António, foi primitivamente dedicada ao Senhor no Horto. O retábulo tem vários símbolos da Paixão de Cristo: coroa de espinhos e cravos no fecho do arco; lança, esponja, látego, escada, tenaz, martelo nas cartelas laterais. Os painéis de azulejos representam igualmente símbolos da Paixão. Duas significativas esculturas de Santa Bárbara e São Bartolomeu, estão incluídas este espaço.

A capela de São Teotónio, foi originalmente dedicada a Nossa Senhora da Copacabana. Actualmente preside São Teotónio, escultura assinada por Manuel de Almeida Portuense (c. 1694). Destaca-se pelo conjunto de talha, mármore e azulejo, para o qual contribuiu D. Francisca Pereira Teles (†1716) e seu filho, Luís Manuel Castanheda de Moura Pereira Teles (†1735), contador-mor do reino, sepultados nesta capela, conforme inscrição na lápide. O notável retábulo em talha dourada, do século XVII-XVIII, integra várias reservas destinadas a relicários. A pintura e douramento da capela foram realizadas por Bernardo da Costa Barradas (1706-1747) e João Crisóstomo Ribeiro (1735). Embutidos de mármore policromo enriquecem a decoração do altar. Os painéis laterais de azulejos têm também simbologia mariana com inscrições: Lua - Pulcra ut Luna (Bela como a Lua), e Sol - Electa ut Sol (Brilhante como o Sol). Encontra-se também, neste espaço, Nossa Senhora da Atalaia, antiga devoção do lugar.

No retábulo da capela do Santíssimo Sacramento, preside um grandioso crucifixo e um sacrário em talha dourada. O fecho do arco tem cartela com três cravos, e no tecto a representação de símbolo eucarístico.

A capela de Nossa Senhora do Bom Despacho teve invocação de Nossa Senhora das Barraquinhas, outrora de grande devoção popular. No retábulo de talha dourada, preside a Virgem do Bom Despacho, imagem de roca em maquineta. Ao centro encontra-se também uma escultura de São Bento – provavelmente originária do antigo mosteiro de São Bento de Xabregas -, ladeada por nichos com baldaquino, integrando as imagens de Santa Teresinha e São João da Cruz. Os painéis de azulejos têm simbologia mariana – cipreste, palmeira.

O retábulo da capela de São Sebastião, também em rica talha dourada, com motivos semelhantes aos da capela-mor, tem as imagens de São José e do Santo Mártir. O sacrário, integrado na predela, está ladeado por anjos em adoração, com atributos de São Sebastião - flechas. Os painéis de azulejos têm também simbologia do Mártir.

Na parede lateral direita da nave, encontra-se a pequena urna com as relíquias do Beato António (†1602), de grande e antiga veneração.

No transepto, destacam-se os grandes altares em talha com motivos dourados, dedicadas ao Sagrado Coração de Jesus e a Nossa Senhora de Fátima. Nas paredes laterais estão inseridos os confessionários.

O magnífico conjunto da capela-mor, atribuído a João António Bellini de Pádua (c. 1690-c.1750) é integralmente esculpido em mármore branco, rosa e cinzento, de notável monumentalidade.

Preside Nossa Senhora da Conceição do Monte Olivete – orago do primitivo convento - ladeada por São Bartolomeu – orago da Paróquia – e Santo Agostinho – Padroeiro da Ordem. Destaca-se, sobre o nicho central, o monograma mariano AM - rodeado de doze estrelas. Em plano superior, está o trono eucarístico em mármore, tendo no remate a Pomba - símbolo do Espírito Santo. As originais colunas torsas em mármore rosa e branco, suportam esculturas de Anjos em adoração. No fecho do arco, está a pedra de armas da rainha D. Luísa de Gusmão, patrona do convento.

O grandioso altar-mor, em mármore negro, tem no tardoz, inscrição latina: Altar da Bem-aventurada Maria, da invocação da Conceição Imaculada, consagrado a 19 de Abril de 1739 por D. Frei Leandro da Piedade, frade professo desta Real Congregação e bispo da Ilha de São Tomé. Sobre a banqueta encontram-se esculturas dos quatro Evangelistas.

As paredes laterais, revestidas por lambril de mármore de várias tonalidades, integram cartelas alternadas, vestígio do espaldar do antigo cadeiral.

Na abóbada encontra-se também o monograma mariano.

Segundo fontes coevas, foi sepultado na capela-mor, o Venerável Frei Manuel da Conceição (†1682), fundador da Ordem dos Agostinhos Descalços em Portugal.

No corredor de acesso à sacristia encontra-se a famosa imagem de Nossa Senhora de Copacabana [Nossa Senhora da Graça], oferecida ao convento em 1706 pela Condessa de Santa Cruz, D. Teresa de Moscoso Sandoval. Foi descrita por Frei Agostinho de Santa Maria (1642-1728): esculpida em madeira na forma das togadas (…) com túnica branca semeada de flores de ouro, manto azul bordado de matizes de pedras e pérolas, ceptro na mão direita, coroa imperial na cabeça, Menino-Deus no braço esquerdo (…).

A Sacristia tem as paredes revestidas de painéis de azulejos historiados do século XVIII, com cenas do Antigo Testamento: O sacrifício de Isaac, Moisés salvo das águas, A partilha da Terra Prometida, David e Saul. Uma pintura mural, de grandes dimensões, representa A Coroação da Santíssima Virgem, possivelmente do início da edificação do convento. É de realçar também o magnífico arcaz do século XVII, e uma notável estante de coro. Encontram-se, neste espaço, duas pinturas A Fuga para o Egipto e Nossa Senhora da Boa Viagem; e imagens de São Joaquim, Santa Ana e Nossa Senhora e de Santa Rita de Cássia.

No coro-alto, ainda com vestígios do antigo cadeiral dos monges, destacam-se as grandes tribunas laterais em talha.



IV . A ORDEM DOS AGOSTINHOS DESCALÇOS

A Ordem dos Eremitas Descalços de Santo Agostinho (OEDSA) teve origem em Itália, sendo aprovada pelo Papa Clemente VIII em 1594 - Breve Decet Romanum Pontificem, com rápida expansão em diversas partes da Europa.

A fundação dos primeiros conventos dos Agostinhos Descalços em Portugal foi impulsionada pelo Padre Frei Manuel da Conceição (†1682), com o patrocínio da rainha D. Luísa de Gusmão (1613-1666). Os dois conventos, feminino e masculino, foram fundados no lugar do Grilo, em Lisboa, donde provém a designação de grilos aos religiosos desta Ordem.

Durante os séculos XVII e XVIII, a ordem desenvolveu-se em Portugal e, especialmente, no Brasil e ilha de São Tomé.

Com o decreto das Cortes de 1822 e a extinção das Ordens religiosas em 1834, os Agostinhos Descalços foram suprimidos em Portugal.

Actualmente, a Ordem encontra-se em diversas partes do mundo, nomeadamente Itália, Brasil e Filipinas.


V . SÃO BARTOLOMEU

Bartolomeu, também chamado Natanael, natural de Caná da Galileia, foi um dos doze Apóstolos. Ouviu de Jesus um dos maiores elogios: «Eis um verdadeiro israelita, em quem não há fingimento» (Jo 1,47). Depois da Ascensão, terá evangelizado a Arábia, a Mesopotâmia e a Arménia, e também a Índia. Foi martirizado em Albanopolis, na Arménia, sendo esfolado vivo, segundo a tradição. As relíquias foram trazidas no final do século X para a Europa, encontrando-se na igreja de São Bartolomeu em Roma.

É representado habitualmente com os atributos alusivos ao martírio - a faca e a própria pele.

A festa litúrgica celebra-se a 24 de Agosto.


    VI . FREI ANTÓNIO DA CONCEIÇÃO (1520-1602)

    António Borges Leitão, nasceu em Pombal a 12 de Maio de 1522. Em 1552 ingressou na Congregação de São João Evangelista, em Évora, com o nome de Frei António da Conceição e onde viveu recolhido durante 20 anos.

    Em 1570 (c.)  transferiu-se para o convento de São Bento em Xabregas, onde realizou um profundo trabalho de acompanhamento espiritual junto da população e de notáveis figuras do Reino. Esteve ligado, a partir de 1592, à construção da nova igreja e respectivo convento - Convento de São Bento de Xabregas da Congregação dos Loios - conhecido como Convento do Beato, para a qual angariou os necessários meios.

    Faleceu a 11 de Maio de 1602, com fama de santidade, sendo perpetuada a sua memória na toponímia do Bairro. Foi sepultado na igreja do convento de São Bento de Xabregas. O processo de beatificação arrastou-se durante mais de um século, não constando que tivesse sido terminado (1).

    A suas relíquias conservam-se actualmente na igreja paroquial de São Bartolomeu do Beato em Lisboa.

     

    1. CARVALHO, José Adriano de Freitas, Um “beato vivo” o P. António da Conceição, C.S.J.E., conselheiro e profeta no tempo de Filipe II, Via Spiritus Vol. 5, INSTITUTO DE CULTURA PORTUGUESA DA FACULDADE DE LETRAS DO PORTO, Porto, 1998.

     

    Referências

    • MATOS, José Sarmento e Jorge Ferreira Paulo, Caminho do Oriente, Guia Histórico II, Livros Horizonte, Lisboa, 1999.
    • MIGUEL, Sidónio, A Paróquia de São Bartolomeu de Lisboa, Olisipo, nº 14 e nº 15,1941.
    • AZEVEDO, Carlos Moreira, Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho em Portugal (1256-1834), Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa, 2011.

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