Igreja paroquial de Nossa Senhora da Encarnação da Ameixoeira, Lisboa
Nesta página:
I . História
II . Descrição
III . Nossa Senhora da Encarnação do Funchal ou da Ameixoeira
I . HISTÓRIA
No lugar da Ameixoeira, no século VII, no tempo das lutas entre cristãos e mouros, havia uma ermida com invocação de Nossa Senhora do Funchal. Em 1276 foi edificada uma nova capela sobre os alicerces da primeira, destruída por um incêndio. Tornou-se um centro de grande devoção ao longo dos séculos, como testemunha uma antiga albergaria de assistência aos peregrinos.
Em 6 de Junho de 1536 foi criada a Paróquia de Nossa Senhora da Encarnação da Ameixoeira. Nos finais do séc. XVI realizaram-se algumas obras, nomeadamente a do portal principal, o lajeado da nave e a colocação do pequeno campanário.
Entre o final do séc. XVII e os inícios do séc. XVIII houve uma grande campanha de obras com a ampliação ou mesmo a reedificação da igreja por alvará régio de D. Afonso VI. Estas obras contaram, para além da Confraria de Nossa Senhora da Encarnação, com o apoio de D. Miguel de Portugal, Conde de Vimioso e D. Pedro II, Regente.
A capela-mor tornou-se mais espaçosa, com retábulo em talha dourada e respectiva tribuna. Foram edificados o arco cruzeiro e os altares colaterais, e as paredes da nave revestidas de azulejo. Foi também ampliado o adro à volta da igreja e, em 1686, colocado o cruzeiro.
Entre 1690-1695 era juiz da confraria o Dr. Mendo de Foios Pereira, secretário de Estado de D. Pedro II, que mandou revestir as paredes da capela-mor com talha semelhante à da tribuna. São deste período as grandes telas laterais e a pintura do tecto em brutesco.
O terramoto de 1755 causou danos significativos na igreja: a fachada principal e a torre sineira foram derrubadas, o coro-alto caiu e perdeu-se o retábulo de invocação de São Cristóvão, encomenda de Cristóvão de Foios. Apenas a capela-mor subsistiu ao sismo.
Em 1760 deu-se início ao restauro da igreja pela Confraria, a expensas do Reverendo José Nunes Vieira. A fachada principal foi reedificada bem como a torre sineira. São desta época os retábulos das capelas laterais, o ciclo de azulejos com Passos da Vida da Virgem, os estuques das paredes da nave e a pintura do tecto da nave e da sacristia.
A antiga albergaria foi vendida em 1883. No início do séc. XX efectuaram-se várias obras na igreja, entre as quais o levantamento do tabuado da nave central, sendo descoberto, junto ao altar-mor, um túmulo quinhentista.
No dia 2 de Fevereiro de 1992, foi inaugurado o novo carrilhão na torre sineira e, no ano seguinte, foram restauradas as capelas laterais de Nossa Senhora da Piedade e do Senhor Jesus Crucificado.
Classificada como Imóvel de Interesse Público em 1990, a igreja de Nossa Senhora da Ameixoeira chegou aos nossos dias com um rico e valioso património e uma tradição milenar.
II . DESCRIÇÃO
Orientada a poente, está rodeada por um pequeno adro e, junto do largo com vista para a várzea, ergue-se o Cruzeiro.
A fachada principal, reedificada após o terramoto, tem no portal, gravada a bronze, a data de conclusão das obras – 1760. Na última década do séc. XX foi gravada no tímpano AVE MARIA MATER DEI (Avé Maria Mãe de Deus) e colocado o relógio.
A torre sineira, também reconstruída após o terramoto, está adossada à fachada em plano ligeiramente recuado e, na fachada ocidental, encontra-se um pequeno campanário colocado em 1559 por Simão Ferreira e também o brasão dos Maias, com inscrição lapidar.
No interior, a capela-mor foi reedificada segundo projecto de Mateus de Sousa (?-1694). O retábulo de talha dourada profusamente decorado, é da autoria de Manuel Álvares, destacando-se ao centro a imagem da padroeira e, nos nichos laterais as esculturas de São José e de Santo António – datada de 1726 e da autoria de Manuel Dias. No fecho do arco, encontra-se uma cartela com monograma M.
No pavimento destacam-se várias sepulturas com inscrições, dos séc. XVI e XVII, de personagens ilustres do lugar, como as da família dos Fóios.
Merecem também especial referência os embutidos em mármore rosa, branco e negro que decoram os degraus do altar-mor bem como os silhares do cruzeiro.
Nas paredes laterais destacam-se duas telas alusivas à Eucaristia: O Pão da Vida com a legenda HIC EST PANIS QVI DE CAELO DESCENDIT NON SICVT MANDUCAVERVNT PATRES VESTRI MANA ET MORTVI SVUNT QVI MANDVCAT HVNC PANEM VIVET IN AETERNVM (Este é o pão que desceu do Céu; não é como aquele que os antepassados comeram, pois eles morreram; quem come mesmo deste pão viverá eternamente Jo. 6, 58) da autoria de Bento Coelho da Silveira (1620-1708) assinada e datada de 1702; e A distribuição da Comunhão com a legenda SVMIT VNVS SVMVNT MILLE TANTVM ISTE QVANTVM ILLE (Quer sejam mil, quer um só, todos recebem o mesmo, Lauda Sion Salvatorem – sequência da Festa do Corpo de Deus) também atribuível a Bento Coelho da Silveira.
Estão integradas neste conjunto, duas pinturas de São Cristóvão e Santa Bárbara, datadas de 1770-1780, da autoria de Pedro Alexandrino (1729-1810).
O medalhão central do tecto representa A Anunciação e, nas cartelas laterais, referências à Virgem: a Oliveira com a legenda QVASI OLIVA SPCIOSA IN CAMPIS Eccli. 24 (Elevei-me como uma formosa oliveira nos campos Ecl 24, 19), e a Palmeira com a legenda STATVRA TVA ASSINALATA EST PALMA Cant.7. (Esse teu porte é semelhante à palmeira Ct 7, 7). Toda a decoração em brutesco, datada de 1702, é da autoria de António da Serra, Caetano de Almeida, Manuel do Monte e Manuel Dias.
O arco cruzeiro – projecto de João Antunes (1643-1712) – está ladeado por altares colaterais onde se veneram actualmente as imagens de Nossa Senhora de Fátima e do Sagrado Coração de Jesus.
Duas capelas laterais reentrantes precedem a capela-mor, à direita dedicada a Nossa Senhora da Piedade, com uma pintura da Descida da Cruz de Pedro Alexandrino. Neste espaço encontra-se um Presépio, provavelmente do séc. XVIII, com as figuras tradicionais portuguesas.
Na capela do Senhor Jesus Crucificado à esquerda, destaca-se no retábulo um grande crucifixo – possivelmente a mesma “imagem milagrosa e mui devota e rara” que aqui foi colocada aquando da instituição da capela; tem subjacente uma tela representando As Trevas do Calvário. Os símbolos da paixão no retábulo e no tecto aludem à invocação da capela. Destaca-se ainda a escultura de madeira estofada de Nossa Senhora do Rosário com o Menino, do séc. XVII. A pia baptismal de pedra, datada de 1536, foi colocada nesta capela na última década do séc. XX.
A nave está separada do presbitério por uma balaustrada decorada com a Cruz de Malta em marfim.
As paredes estão revestidas com painéis de azulejos colocados na segunda metade do séc. XVII; são painéis monocromos, recortados, que representam cenas da Vida da Virgem e da Encarnação de Cristo: Nascimento de Nossa Senhora e Anunciação nas paredes laterais; Adoração dos reis magos e Adoração dos pastores no sub-coro. Pilastras, anjos e festões, intercalados com figuras de Anjos com símbolos marianos – Rosa, Lua, Estrela, Sol – completam as composições.
Símbolos da litania mariana em baixo-relevo – Barca, Cálice, Trono, Casa, Arca, Corações trespassados... – decoram a parte superior das paredes da nave.
O tecto apresenta uma composição grandiosa, centrada na Encarnação, pintura atribuída a Pedro Alexandrino, circundada por vários painéis também com símbolos marianos (Poço, Fonte, Oliveira, Espelho, Rosa, Sol, Lua…)
Os púlpitos em talha, também decorados com simbologia mariana, estão datados de 1734; o do lado direito está atribuído ao entalhador Francisco Ferreira. Na parte superior da parede destaca-se a representação alusiva ao Espírito Santo.
A sacristia, ao lado da capela-mor, está revestida por um silhar de azulejos de padrão, quinhentistas, com representações eucarísticas, provavelmente do conjunto cerâmico que decorava as paredes baixas da capela-mor antes do terramoto. Os dois grandes painéis do tecto em pintura de brutesco têm também motivos eucarísticos – a fénix e o pelicano.
Um grande arcaz do séc. XVII, em madeira do Brasil, com rico lavor de ferragens e embutidos, ocupa toda a parede lateral. Numa das paredes encontra-se um lavabo de mármore, com as inscrições SEBASTIÃO RIBEIRO: 1560 e SENHOR LAVEI MINHAS MÃOS E FIQUEI LIMPO. Várias telas decoram as paredes – Nossa Senhora da Conceição, A Visitação, Cristo Crucificado – além de um pequeno retábulo representando o Calvário na parede fundeira.
Na sacristia encontra-se também o primitivo sacrário da igreja, recuperado, em talha dourada com motivos eucarísticos.
III . NOSSA SENHORA DA ENCARNAÇÃO DA AMEIXOEIRA
Segundo a tradição, a primitiva invocação da igreja, Nossa Senhora do Funchal, tem a sua origem na imagem encontrada num funchal no período das lutas entre cristãos e mouros. A partir de 1536, data da instituição da freguesia, passou a designar-se Nossa Senhora da Encarnação da Ameixoeira.
Desde o início foi local de grande devoção, onde afluíam muitos romeiros e devotos vindos de longe. Ainda no séc. XVIII as cerimónias religiosas tinham uma especial relevância durante as festas da padroeira.
A Confraria de Nossa Senhora da Encarnação do Funchal foi instituída em 1276, e em 1593 passou a Confraria de Nossa Senhora da Encarnação da Ameixoeira até 1831, ano em que se dá a união com a Irmandade do Santíssimo – Irmandade do Santíssimo Sacramento e de Nossa Senhora da Encarnação da Ameixoeira. Pertenciam à confraria fidalgos do lugar que muito contribuíram para as obras da igreja.
A actual invocação Nossa Senhora da Encarnação faz referência à maternidade de Maria. “A Santíssima Virgem é Mãe de Deus visto que gerou segundo a carne o Verbo de Deus encarnado” (Concílio de Éfeso).
A festa litúrgica coincide com a festividade da Anunciação, 25 de Março. Actualmente realiza-se no último Domingo de Maio, celebrada como anteriormente, com grande solenidade.
Referências:
- SANTA MARIA, Frei Agostinho de, Santuário Mariano e historia das imagens milagrosas de Nossa Senhora (...), Tomo 1, Lisboa, 1707.
- ESPÍRITO SANTO, Eugénio do, Ameixoeira: um núcleo histórico, Lisboa, 1997.
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